Ser lisboeta é…

Roupa No Estendal

Perdoe-me o leitor habitual do Sixhat Pirate Parts pela história que vou contar a seguir. Trata-se de uma história pessoal, de algo que pode não lhe interessar aqui, onde normalmente falo de tecnologia, de complexidade e coisas que tais. Conceda-me um pequeno perdão por isto.

A minha vida sempre foi dividida entre muitas terras. Nasci em Viana do Castelo, mas os primeiros anos da minha infância foram passados numa aldeia de Ponte do Lima. Depois, por sortes da vida, estive um ano no distrito de Braga e outro em pleno Alentejo perto da bela vila de Odemira. Foi também nessa altura que entrei para ciclo e onde me comecei a tornar um pouco “independente”.

No ano seguinte voltei para o Norte, desta vez finalmente para Viana do Castelo. Aos 17 anos vim para Lisboa para a Universidade e desde então (agora com 35) estive na capital (se exceptuarmos alguns passeios amorosos por outras capitais de distrito).

Ao todo passei 18 anos da minha vida na capital, mas nunca durante este tempo fui munícipe da cidade de Lisboa. Continuei sempre a manter a minha residência fiscal em Viana do Castelo. Ia votar a Viana, a minha médica de família era em Viana, a segurança social era em Viana… Efectivamente estava em Lisboa desterrado.

Acontece que por motivos de força maior (o Saldanha Residence ser paragem de carteiristas profissionais) vi-me obrigado a pedir 2ª vias de todos os meus documentos (salvou-se o passaporte). Aproveitando a situação e atendendo a que agora ia pedir o cartão de cidadão (em vez de 50 mil papeis e cartõezitos) mudei também a minha morada fiscal para Lisboa.

A partir desta data vou passar a colocar uma morada de Lisboa nos meus documentos. Não que troque de terra, serei sempre Vianense no coração e no sangue, mas é verdade que também sou daqui, tal o tempo que já cá passei. E é neste ambivalência que me encontro, tal como Mário de Sá-Carneiro nas suas dúvidas, de ter duas terras ou não ter nenhuma.

Hoje ao regressar a casa a pé disse para mim mesmo: “Hoje é verdadeiramente o primeiro dia em que estás a regressar a tua casa, David”. É uma sensação de mudança sem o ser verdadeiramente. Na prática quase nada muda. É apenas um quadro de referência mental.

Não sei se para Lisboa eu sou Lisboeta, mas sei que Lisboa é parte do que eu sou.

Obrigado pela paciência.