Sobre o caso 1984 da Amazon

kindlegate

CEO da Amazon apresentando o Kindle DX

Uma das grandes confusões da semana passada foi o caso 1984 da Amazon! Não falei antes no assunto por estar num curto descanso no Alentejo, mas o facto permitiu-me ter tempo para reflectir um pouco mais no assunto. A minha primeira reacção foi “A amazon matou o kindle com esta atitude, quem é que vai agora comprar um kindle se não tem sequer a garantia que aquilo que compra será seu?” Depois surgiu a comparação “e se a Bertrand, depois de lhe vender em casa, mandasse uns empregados saltar pela janela e recuperar os livros deixando-lhe o dinheiro em cima da mesinha de cabeceira?” Claro que isto é inconcebível e segundo a lei é crime de furto. Porque depois de vendido, o livro não pertence mais ao vendedor. Mas aquilo que parece obviamente um crime, nos EUA não é. COMO? Sim.. a Amazon fez o que fez, porque nunca na verdade vendeu o livro. Apenas vendeu (em letras muito miudinhas) uma licença de utilização que pode revogar a pretexto do que lhe apetecer. Ou seja, para a Amazon e para a lei americana, o crime é permitido se for escrito num End User Licence Agreement.

Isto é o problema da Amazon, da Apple e de muitos outros,que possuem o produto que alegam “vender” e o aparelho para o qual esse produto é desenvolvido. É a história da rádio a repetir-se novamente. No princípio da rádio, cada emissora vendia o seu aparelho de rádio, pre-sintonizado, para uma dada frequência. Rapidamente o público respondeu que não era viável ter 50 aparelhos de rádio diferentes para ouvir as diversas estações (embora na altura fossem apenas duas ou três). Acontece que a dada altura foi preciso construir aparelhos de rádio que não pertencessem às estações, que fossem “agnósticos” e que permitissem ao utilizador escolher qual a frequência de sintonização. A Amazon, e a Apple com a Apple Store e iTunes Store, querem, por força dos seus dispositivos e gadgets, aplicar o seu sistema de lock in aos conteúdos que fornecem. A seu tempo o público reagirá e principalmente reagirá com a força das suas carteiras.

A meu ver o disparate da Amazon não é ainda o fim do Kindle. Até porque o que aconteceu levará a Amazon a conseguir esmagar as margens dos detentores das publicações e o público, em geral acéfalo, com uma baixa de preço esquece facilmente o princípio errado subjacente ao que aconteceu… até à próxima privação das “aparentes liberdades” individuais.

Extra: Estava a acabar de escrever este artigo e eis que chegou a notícia de que a Barnes & Noble também vai entrar no mercado dos e-Book e e-Book Readers, com um acordo de exclusividade com o Plastic Logic (ver vídeo a seguir, se o WSJ deixar…).

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Para já prometem ter 700 000 títulos contra os 300 000 da Amazon e ser compatíveis com iPhone e Blackberry… O único defeito é mesmo a questão da exclusividade. O que aconteceu com a Amazon mostrou o erro do DRM e dos sistemas fechados e a Barnes and Noble parece querer fazer o mesmo.